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ÁLAMO ESGUIO

Tributo à memória e à obra religiosa, artística e cultural do P.e Manuel Coelho de Sousa (1924-1995), figura cimeira da Igreja e cultura açoriana do século XX, como padre, jornalista, poeta, professor, orador, escritor,dramaturgo e animador cultural

ÁLAMO ESGUIO

Tributo à memória e à obra religiosa, artística e cultural do P.e Manuel Coelho de Sousa (1924-1995), figura cimeira da Igreja e cultura açoriana do século XX, como padre, jornalista, poeta, professor, orador, escritor,dramaturgo e animador cultural

Coelho de Sousa: É esta nuvem de mim...(III)

DSousa, 29.11.07


(III)



Mas Deus é pai
E o pai sempre se dói
Sempre perdoa.
Correram séculos
e assim foi.
Atendei, escutai
Do resgate o hino
posto em loa:




E os séculos foram grãos de muita areia quente
ardidos pelo fogo em aras ao céu erguida
À mão de Abel, o casto, humilde e são, temente
Ou de Caim odioso que lhe tira a vida...

Estrelas que se contam desmedidamente
Junto ao cordeiro em monte, vítima devida,
E sangue na portada assinalando a gente
Que o mar há-de passar a terra prometida.

Água de noite e dia e fogo de Sodoma,
Patriarcais suspiros, lutas e espera,
Cetro de rei e salmo, iris de dor em soma,

Anseios de profetas abrindo ao futuro
o passo e o rumo certo de uma nova era,
até que o messias fosse áureo esteio seguro.



Coelho de Sousa: É esta nuvem de mim...(II)

DSousa, 27.11.07


(II)


E toda a história humana
se desdobra em mim
desde Adão a Cristo
escrita assim:



Espesso, denso, imenso como um céu
de chumbo negro, opaco e opressor
nasceu, avassalou, recrudesceu
E dominou o mundo num terror,

Que pôs em cada fronte asco e labéu,
em cada lábio roxo, acre travor ,
em cada peito exangue, um escarcéu,
em cada vida e alma, um vil torpor.

E foi de chama ardente, enorme incêndio.
O que ficou no  mundo de estipêndio
Ao dente posto na maçã comida!

Perdeu-se em cada lábio, alvo sorriso.
Fechou-se a porta áurea ao paraíso.
E pranto e dor e morte herdou a vida.





Coelho de Sousa: É esta nuvem de mim...(I)

DSousa, 25.11.07



Estimado ouvinte,
volta hoje ao RCA a rubrica

a vida é para ti.

E, desta vez, ambientada pelo
mistério das almas
deste Novembro
ensombrado das bombas
da maldade humana.

Toda ela é uma atitude
de quem vive
numa expectativa misteriosa.

Assim, fica-se a minha alma
num silêncio envolta...
E o estro à pena logo a rima solta,
assim feita encantamento:

l


Domina-me um silêncio extasiante,
Nimbada a fronte fica do sublime.
É raio que a ilumina um só instante?
É prenda à cruz divina que a redime?

É cravo em mão aberta ou peito arfante
ao coração que em lança amor encime?
Ou é demónio atrás de fauce hiante
que ao dente do pecado a vida oprime?

Rompam silêncio, venham dizer quem
me fez extasiado este momento?
Foi Deus? Foi demónio? Ou foi ninguém?

Respondam, que o sublime é já tormento.
Foi Deus? Foi demónio? Que me falem!
Silêncio. Silêncio!  Encantamento!

Coelho de Sousa: Para além da última estrela (V e último)

DSousa, 23.11.07



(V)





Entendes quanto fica neste verso
ouvido entre acordes de Beethoven?

É alto e fundo, unido e disperso
o seu sentido eterno, que mal ouvem
os homens deste mundo vário, incerto,
o grito da distância que convém
e sem findar atroa o universo
em lama e treva que se não comovem!

Oh! pródigo da luz, oh! desgarrado,
não cantes mais a letra desse fado
triste. Toca guitarra, exulta e ri alegre.
Herói e santo, de vencida
Hás-de levar a morte. É tua a vida,
bela e feliz. E a vida é só para ti.


Observação: Como se pode confirmar pelo original, Coelho de Sousa colocou a data da escrita deste texto, no seu fim e não a antecedê-lo, como habitualmente fazia. Deste facto só me apercebi depois da sua transcrição para o blogue.





Coelho de Sousa: Para além da última estrela (IV)

DSousa, 21.11.07



(IV)





Areias e estrelas, uma a uma,
serão rosário preso em cadeia
Para rezar  à vida... Nenhuma
há-de faltar ao fogo que a incendeia.

O peito nosso aberto e que se alteia
na chama vertical por que se afirma.

Estrelas são no céu áurea candeia.

Areias são incenso que se esfuma.

E brasa e fumo são nosso fadário
de areias e estrelas em rosário...

O sol será pai-nosso, e mais a lua,
piedosa e doce mãe, Salvé rainha
a quem eu devo e dou a vida minha
a quem darás, volvendo, a vida tua!


Coelho de Sousa: Para além da última estrela (III)

DSousa, 19.11.07



(III)




Não deixes de colher por esse
mundo
O fruto dos teus olhos e teus passos...

A mão aberta em dar e receber
profundo
o que se gera na terra e grana
nos espaços.

Da tua língua e lábios,
esse abismo fundo,
Floresça a fala, o beijo amadureça,
abraços
se cruzem peito a peito em que feliz me inundo
perdido e encontrado num anel de braços.

À porta do palácio fique o tal ferrete
E vá adiante a aura p'ra o banquete.
Na mesa, há pão e vinho que ofertou amor.
Há música de anjos a cantar bem-vindo
E paz e alegria num regresso infindo
da vida assim, meu Deus, que paraíso em flor!



Coelho de Sousa: Para além da última estrela (II)

DSousa, 15.11.07



(II)




Ouviste como soa o violino
no frémito das cordas?

Parece grito são, divino
Que um dia te acordou,
recordas,
do nada que tu eras?

E foi para te dar
alto destino,
amar,
que tu crês e esperas.



Tu sabes como eu:
Não cabe nas esferas
da terra negra e céu
de nuvem breve
a força da evasão
que em nós nasceu.

Para retê-la aqui
qualquer esforço é vão.

Deixa que a graça a leve,
E deixa-te subir, voar.

Que a vida é para ti,
além de tudo...

E o mar
sem horizonte,
em si total, inteiro,
Há-de ser paz e fonte
do teu viver primeiro.




Coelho de Sousa: Para além da última estrela (I)

DSousa, 13.11.07



(I)









Quiseram que eu voltasse em mais
este concerto
em ré maior.

Voltei, é certo,
Ninguém resiste à lei do puro
amor.

E volto para dizer aqui
o mesmo que há sete anos;
Embora a dor,
O pranto,
O sonho e mil enganos,
A vida é para ti...
A vida é para ti, enquanto
neste mundo for
teu corpo e alma...

A vida é para ti, muito melhor,
depois que a palma
de bem vivê-la
te for entregue além
da última estrela


Coelho de Sousa: A vida é para ti...sete anos depois

DSousa, 11.11.07

D
epois desta breve interrupção de alguns dias, vamos regressar com textos não-publicados de Coelho de Sousa, mas por ele utilizados no Rádio Clube de Angra.
Ele próprio fez uma interrupção de sete anos no Programa "A vida é para ti", tendo regressado à antena daquela Rádio a partir de  Outubro de 1961.
O  primeiro dos textos da "sebenta" onde se encontram estes originais não tem data, mas o segundo está  datado de 3 de Novembro de 1961. E  é também  de Outubro de 1961, a data que figura na capa da dita sebenta.

É esta a relação completa dos textos do presente caderno de originais:

        Para além da última estrela

Esta nuvem de mim                  3 de Novembro de 1961

  As queixas dele..                    17 de Novembro de 1961

Dia grande                                1 de Dezembro de 1961

6 sonetos                                  15 de Dezembro de 1961

7 sonetos                                 22 de Dezembro de 1961

O mar e a saudade                    9 de Fevereiro de 1962

Romance das mães                 22 de Fevereiro de 1962
que choram

        Ante o presépio                        4 de Janeiro de 1962

        São versos
        de Pentecostes                          7 de Junho de 1962


Nota: posteriormente veio a verificar-se que o primeiro dos programas de rádio deste caderno (para além da última estrela) tem a data de 19 de Outubro de 1961.

Coelho de Sousa: Aquele Adeus era de Irmãos (XII e último)

DSousa, 04.11.07


(XII)






E dois dias se passaram!

Frei Bento chega à janela...

- Em pleno dia, uma estrela!

É ela! É ela!

- Branca pomba que vôa!
Lá tão alto para o céu!
Deus meu! Deus meu!!

É ela! É ela..
.

Vai buscar divina c'roa
merecida
Por quem traz a alma acesa,
em teu amor
tua vida
Oh! Senhor!


Escolástica, Senhora irmã, já morreu...
Oh! Santa, vela por mim
lá do céu eternamente,
até que volte a encontrar-te
no amor, na vida... sem fim.




Para a maioria dos leitores que não terão conhecimento dos factos que estão na origem deste texto de Coelho de Sousa, aqui se reproduzem, tal como vêm descritos na Enciclopédia Verbo:
"Santa  Escolástica,Monja, irmã de São Bento (c.480-c.547) Segundo os "Diálogos" de São Gregório Magno, teria sido consagrada à vida religiosa desde a infância, e veio a habitar com outras monjas perto do Mosteiro  de Monte Cassino.  Encontrava-se de vez em quando com  o irmão para  conversarem de assuntos espirituais. Numa ocasião obteve do céu uma tempestade para prolongar o colóquio espiritual. Três dias depois, São Bento viu a sua alma subir aos Céu em forma de pomba, e mandou enterrá-la no seu próprio túmulo".



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