Quinta-feira, 29 de Novembro de 2007
Coelho de Sousa: É esta nuvem de mim...(III)


(III)

Mas Deus é pai
E o pai sempre se dói
Sempre perdoa.
Correram séculos
e assim foi.
Atendei, escutai
Do resgate o hino
posto em loa:

E os séculos foram grãos de muita areia quente
ardidos pelo fogo em aras ao céu erguida
À mão de Abel, o casto, humilde e são, temente
Ou de Caim odioso que lhe tira a vida...
Estrelas que se contam desmedidamente
Junto ao cordeiro em monte, vítima devida,
E sangue na portada assinalando a gente
Que o mar há-de passar a terra prometida.
Água de noite e dia e fogo de Sodoma,
Patriarcais suspiros, lutas e espera,
Cetro de rei e salmo, iris de dor em soma,
Anseios de profetas abrindo ao futuro
o passo e o rumo certo de uma nova era,
até que o messias fosse áureo esteio seguro.
Terça-feira, 27 de Novembro de 2007
Coelho de Sousa: É esta nuvem de mim...(II)


(II)
E toda a história humana
se desdobra em mim
desde Adão a Cristo
escrita assim:

Espesso, denso, imenso como um céu
de chumbo negro, opaco e opressor
nasceu, avassalou, recrudesceu
E dominou o mundo num terror,
Que pôs em cada fronte asco e labéu,
em cada lábio roxo, acre travor ,
em cada peito exangue, um escarcéu,
em cada vida e alma, um vil torpor.
E foi de chama ardente, enorme incêndio.
O que ficou no mundo de estipêndio
Ao dente posto na maçã comida!
Perdeu-se em cada lábio, alvo sorriso.
Fechou-se a porta áurea ao paraíso.
E pranto e dor e morte herdou a vida.

Domingo, 25 de Novembro de 2007
Coelho de Sousa: É esta nuvem de mim...(I)

Estimado ouvinte,
volta hoje ao RCA a rubrica
a vida é para ti.
E, desta vez, ambientada pelo
mistério das almas
deste Novembro
ensombrado das bombas
da maldade humana.
Toda ela é uma atitude
de quem vive
numa expectativa misteriosa.
Assim, fica-se a minha alma
num silêncio envolta...
E o estro à pena logo a rima solta,
assim feita encantamento:
l
Domina-me um silêncio extasiante,
Nimbada a fronte fica do sublime.
É raio que a ilumina um só instante?
É prenda à cruz divina que a redime?
É cravo em mão aberta ou peito arfante
ao coração que em lança amor encime?
Ou é demónio atrás de fauce hiante
que ao dente do pecado a vida oprime?
Rompam silêncio, venham dizer quem
me fez extasiado este momento?
Foi Deus? Foi demónio? Ou foi ninguém?
Respondam, que o sublime é já tormento.
Foi Deus? Foi demónio? Que me falem!
Silêncio. Silêncio! Encantamento!

Sexta-feira, 23 de Novembro de 2007
Coelho de Sousa: Para além da última estrela (V e último)


(V)

Entendes quanto fica neste verso
ouvido entre acordes de Beethoven?
É alto e fundo, unido e disperso
o seu sentido eterno, que mal ouvem
os homens deste mundo vário, incerto,
o grito da distância que convém
e sem findar atroa o universo
em lama e treva que se não comovem!
Oh! pródigo da luz, oh! desgarrado,
não cantes mais a letra desse fado
triste. Toca guitarra, exulta e ri alegre.
Herói e santo, de vencida
Hás-de levar a morte. É tua a vida,
bela e feliz. E a vida é só para ti.
Observação: Como se pode confirmar pelo original, Coelho de Sousa colocou a data da escrita deste texto, no seu fim e não a antecedê-lo, como habitualmente fazia. Deste facto só me apercebi depois da sua transcrição para o blogue.
Quarta-feira, 21 de Novembro de 2007
Coelho de Sousa: Para além da última estrela (IV)
Segunda-feira, 19 de Novembro de 2007
Coelho de Sousa: Para além da última estrela (III)
Quinta-feira, 15 de Novembro de 2007
Coelho de Sousa: Para além da última estrela (II)

(II)

Ouviste como soa o violino
no frémito das cordas?
Parece grito são, divino
Que um dia te acordou,
recordas,
do nada que tu eras?
E foi para te dar
alto destino,
amar,
que tu crês e esperas.

Tu sabes como eu:
Não cabe nas esferas
da terra negra e céu
de nuvem breve
a força da evasão
que em nós nasceu.
Para retê-la aqui
qualquer esforço é vão.
Deixa que a graça a leve,
E deixa-te subir, voar.
Que a vida é para ti,
além de tudo...
E o mar
sem horizonte,
em si total, inteiro,
Há-de ser paz e fonte
do teu viver primeiro.