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ÁLAMO ESGUIO

Tributo à memória e à obra religiosa, artística e cultural do P.e Manuel Coelho de Sousa (1924-1995), figura cimeira da Igreja e cultura açoriana do século XX, como padre, jornalista, poeta, professor, orador, escritor,dramaturgo e animador cultural

ÁLAMO ESGUIO

Tributo à memória e à obra religiosa, artística e cultural do P.e Manuel Coelho de Sousa (1924-1995), figura cimeira da Igreja e cultura açoriana do século XX, como padre, jornalista, poeta, professor, orador, escritor,dramaturgo e animador cultural

Coelho de Sousa: Romance das mães que choram (II)

DSousa, 27.02.08




Só a mãe ficou chorando...
Está esperando outra vez...
Já não quer olhos azuis
E nem pensar na alvura,
Menos ainda em sorrisos,
O filho do meu amor
Há-de ser como Deus queira,
silenciava consigo...


Desabrochou outra flor,
Amadureceu outro fruto...
Um menino! E que perfeito.
É moreno, a cor do pai...
Olhos verdes,  esperança!
E o que há-de ser, o meu filho?





Coelho de Sousa: Romance das mães que choram (I)

DSousa, 25.02.08








Romance das mães que choram
vou contar em verso branco
Para honrar todas as mães
Que já choraram nesta  vida.

Quem mais ama é quem mais sofre
E mais que a Mãe ninguém ama.
É por isso que o seu pranto
É maior que o mar imenso.

O seu pranto hei-de guardar
em meu coração de filho.
Nascemos para sofrer
E o pranto alivia a dor!


Certa mãe que eu conheci
Ao filho do seu amor
Esperou os meses todos.
E dizia a toda a gente:
Há-de ter olhos azuis,
Há-de ser branco de neve,
Nascerá rindo para mim.
Foi uma filha ceguinha
E escura como a dor
Que veio ao mundo a chorar.
E depois de baptizada
A menina foi-se embora
Abrir os olhos no céu.



Coelho de Sousa: É uma nuvem

DSousa, 23.02.08



É uma nuvem...





É uma nuvem trágica, infernal,
Que vem e que se apossa do meu ser.
O corpo fica lasso com o mal
E a alma  negra e fria a apodrecer.

Não há nem mais a mente para entender
Que a terra é tanta, a fúria é tal
Que o Verbo já não é. E para ver
Os olhos são de múmia espectral.


Envolta nos panais da ingratidão,
Mirrada dia a dia ao gosto vão
Do ser-não-ser como em delírio.

Oh Deus, como o arminho que da lama foge
Queria eu fugir da nuvem negra de hoje...
Ma seu sou eu. E a nuvem é o meu martírio.









Coelho de Sousa: Dobra o Sino

DSousa, 21.02.08


Dobra o sino...






Dobra o sino a finados, dia e noite e mês
Num toque de plangência dolorida e atroz.
E ouço e vejo nele o eco duma voz
Que é nossa, meus irmãos, é minha e de vocês;


Dos que se foram ontem, tão longe de nós
De quantos vão agora ou amanhã talvez,
aquele toque triste a soma toda fez
e na saudade amarga da minha alma pôs.


E eu conto as badaladas em milénios de anos
eternizados lá mas sem conter enganos
que as contas deste dia aqui possam levar...


Dobra o sino a finados, mortos em colheita:
à esquerda os sem memória, eleitos à direita.
E eu em qual dos lados me hei-de encontrar?



Coelho de Sousa: Quando o Silêncio

DSousa, 19.02.08
                     Quando o Silêncio...



Quando o silêncio me domina
E não sou mais que um ponto no infinito,
Eu sinto dentro em mim ânsias de um grito
A voz da alma  pequenina!



A noite é como um lago onde não cresce
Nenufar doiro ou sangue ou nada...
E vem dentro de nós alada
a voz do imponderável que entumesce...



E faz-se a onda viva, enorme,
batendo as praias todas da nossa alma...
- mar de Silêncio e Ciúme  e Peixe e Calma -
Que ao fundo o turbilhão já dorme.



Meu grande nauta delirante,
Que vais na barca e rumo nessa Estrela.
Marca bem o rumo, rasga-te a Vela,
A proa erguida, avante!


Nota   Este é um poema introduzido aqui, por razões semelhantes ao anterior. Aparece numa folha solta deste caderno de 1962 mas, pela temática, parece datar dos anos 50, altura da composição e edição dos "Poemas de Aquém e Além", onde abundam estes  temas dos estados de alma, ao mesmo tempo personalizados e abstractos.

Coelho de Sousa: Saudade

DSousa, 16.02.08



Saudade



Uma saudade ficou
Perdida dentro de mim.
Nunca vi saudade assim!
Quem seria que a encontrou?

Foi no mar que se perdeu
(É um mar que tenho em mim)
Nunca vi saudade assim
Se alguém achou, não ma deu!

Saudade sempre perdida,
Perdida dentro de mim!
Nunca vi saudade assim,
Saudade da minha vida.

Pergunto aos cardos, à bruma,
Se a encontraram dentro em mim?
Responderam:Saudade assim,
Não se encontra em parte alguma

E no entanto é verdade:
Perdeu-se dentro de mim.
Nunca vi saudade assim
Saudade doutra saudade!




Nota: Resolvi introduzir este poema aqui, pelo seu tema.
Com efeito, datando de 1956, portanto, meia dúzia de anos antes dos poemas do caderno que tenho vindo a publicar, a sua temática e conteúdo são paralelos aos do caderno.
Até parece um sumário condensado, e de grande inspiração e beleza formal,  do tema que Coelho de Sousa desenvolveria, anos depois, aos microfones do Rádio Clube de Angra. Curiosamente ainda, encontrava-se entre as páginas deste caderno, com o formato de um postal ou ficha.
Ou por simples acaso, ou, quem sabe, porque Coelho de Sousa o terá utilizado como mote, que desenvolveu anos depois.


Coelho de Sousa: Do Mar e da Saudade (X e último)

DSousa, 14.02.08




DO MAR E DA SAUDADE ( X e último)








Ah! se ao menos eu soubera
A saudade sublimar!
Era o céu em vez do mar
E a vida só Primavera!


Saudade, tanta saudade!
As saudades que eu senti
Da "vida que é para ti"
E será felicidade!


Se para a razão é a verdade,
E para o amor é a queixa
A saudade não me deixa
Nem eu deixo a saudade.


Nesta vida, a saudade
Nunca mais há-de acabar
Como não se acaba  o mar
A não ser na eternidade.

Saudade! Tanta Saudade!
As saudades que eu senti!
Até da "vida é para ti"
Eu já sinto saudade...




Coelho de Sousa: Do Mar e da Saudade (IX)

DSousa, 12.02.08




DO MAR E DA SAUDADE (IX)



Essa distância é de mar
Onda a onda o amargor,
Infindo, imenso o amor
Sem a presença tocar...


A saudade não termina
Como não se acaba o amor...
É mar, é sal-amargor
Esta saudade mofina.


Indesejável que seja,
A saudade ou a censura,
Não a quero... Mas procuro
Como um bem que se deseja.



E fica a vida um duelo,
Um tormento sem proveito
Campo aberto, o ser desfeito
Amargo amor e desvelo.





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