Tributo à memória e à obra religiosa, artística e cultural do P.e Manuel Coelho de Sousa (1924-1995), figura cimeira da Igreja e cultura açoriana do século XX, como padre, jornalista, poeta, professor, orador, escritor,dramaturgo e animador cultural
Tributo à memória e à obra religiosa, artística e cultural do P.e Manuel Coelho de Sousa (1924-1995), figura cimeira da Igreja e cultura açoriana do século XX, como padre, jornalista, poeta, professor, orador, escritor,dramaturgo e animador cultural
Só a mãe ficou chorando... Está esperando outra vez... Já não quer olhos azuis E nem pensar na alvura, Menos ainda em sorrisos, O filho do meu amor Há-de ser como Deus queira, silenciava consigo...
Desabrochou outra flor, Amadureceu outro fruto... Um menino! E que perfeito. É moreno, a cor do pai... Olhos verdes, esperança! E o que há-de ser, o meu filho?
Romance das mães que choram vou contar em verso branco Para honrar todas as mães Que já choraram nesta vida.
Quem mais ama é quem mais sofre E mais que a Mãe ninguém ama. É por isso que o seu pranto É maior que o mar imenso.
O seu pranto hei-de guardar em meu coração de filho. Nascemos para sofrer E o pranto alivia a dor!
Certa mãe que eu conheci Ao filho do seu amor Esperou os meses todos. E dizia a toda a gente: Há-de ter olhos azuis, Há-de ser branco de neve, Nascerá rindo para mim. Foi uma filha ceguinha E escura como a dor Que veio ao mundo a chorar. E depois de baptizada A menina foi-se embora Abrir os olhos no céu.
Dobra o sino a finados, dia e noite e mês Num toque de plangência dolorida e atroz. E ouço e vejo nele o eco duma voz Que é nossa, meus irmãos, é minha e de vocês;
Dos que se foram ontem, tão longe de nós De quantos vão agora ou amanhã talvez, aquele toque triste a soma toda fez e na saudade amarga da minha alma pôs.
E eu conto as badaladas em milénios de anos eternizados lá mas sem conter enganos que as contas deste dia aqui possam levar...
Dobra o sino a finados, mortos em colheita: à esquerda os sem memória, eleitos à direita. E eu em qual dos lados me hei-de encontrar?
Quando o silêncio me domina E não sou mais que um ponto no infinito, Eu sinto dentro em mim ânsias de um grito A voz da alma pequenina!
A noite é como um lago onde não cresce Nenufar doiro ou sangue ou nada... E vem dentro de nós alada a voz do imponderável que entumesce...
E faz-se a onda viva, enorme, batendo as praias todas da nossa alma... - mar de Silêncio e Ciúme e Peixe e Calma - Que ao fundo o turbilhão já dorme.
Meu grande nauta delirante, Que vais na barca e rumo nessa Estrela. Marca bem o rumo, rasga-te a Vela, A proa erguida, avante!
Nota Este é um poema introduzido aqui, por razões semelhantes ao anterior. Aparece numa folha solta deste caderno de 1962 mas, pela temática, parece datar dos anos 50, altura da composição e edição dos "Poemas de Aquém e Além", onde abundam estes temas dos estados de alma, ao mesmo tempo personalizados e abstractos.
Uma saudade ficou Perdida dentro de mim. Nunca vi saudade assim! Quem seria que a encontrou?
Foi no mar que se perdeu (É um mar que tenho em mim) Nunca vi saudade assim Se alguém achou, não ma deu!
Saudade sempre perdida, Perdida dentro de mim! Nunca vi saudade assim, Saudade da minha vida.
Pergunto aos cardos, à bruma, Se a encontraram dentro em mim? Responderam:Saudade assim, Não se encontra em parte alguma
E no entanto é verdade: Perdeu-se dentro de mim. Nunca vi saudade assim Saudade doutra saudade!
Nota: Resolvi introduzir este poema aqui, pelo seu tema. Com efeito, datando de 1956, portanto, meia dúzia de anos antes dos poemas do caderno que tenho vindo a publicar, a sua temática e conteúdo são paralelos aos do caderno. Até parece um sumário condensado, e de grande inspiração e beleza formal, do tema que Coelho de Sousa desenvolveria, anos depois, aos microfones do Rádio Clube de Angra. Curiosamente ainda, encontrava-se entre as páginas deste caderno, com o formato de um postal ou ficha. Ou por simples acaso, ou, quem sabe, porque Coelho de Sousa o terá utilizado como mote, que desenvolveu anos depois.